quarta-feira, 27 de março de 2019

Resenha: Renato Russo O Filho da Revolução






























Título: Renato Russo: O Filho da Revolução
Autor: Carlos Marcelo
Editora: Editora Agir
Ano de publicação no Brasil: 2013
Número de páginas: 424
Onde encontrar: Americanas / Submarino / Skoob
Nota: 5 / 5


Renato Russo: O Filho da Revolução é um livro de não-ficção, uma biografia contada em forma de romance. O livro narra a história de Renato Manfredini Júnior desde o nascimento, fala sobre sua primeira infância no Rio de Janeiro, a mudança para Brasília pouco tempo depois de inaugurada e todas as promessas que a cidade trazia, a temporada morando nos Estados Unidos e a volta para o Brasil. 

Como a história de Brasília diz muito sobre a história de Renato, o autor faz uma longa descrição da construção da cidade, fala sobre os políticos influentes da época e fala sobre o que eles fizeram enquanto estavam no poder. Na releitura, isso me interessou bastante, devido ao atual período político que estamos vivendo. E claro, como Renato - sempre chamado de Júnior pela família - foi criando sua carreira artística no período em que vivíamos a ditadura militar, o livro fala muito disso. Dos protestos, das pessoas que eram presas, dos filhos de policiais que mesmo fazendo coisas erradas não eram presos, dos policiais que obviamente tinham carta branca para fazer o que quiserem, e de todo o sofrimento que essa época trouxe, sempre colocando Renato e o cenário musical da época em foco.





























No livro ficamos sabendo de como Renato passou sua juventude antes de assumir a música como carreira, sobre a faculdade e sobre os trabalhos, como por exemplo lecionar inglês e ser radialista. Ele era um jovem de classe média, assim como a grande maioria dos seus amigos e pessoas de seu ciclo de convívio, que sempre tinha dinheiro para gastar em bebidas e drogas, o que foi se tornando um problema ao longo dos anos, já que Renato muitas vezes perdia o controle e na maioria das vezes ele não era o único prejudicado com a situação.

Algo muito positivo nesse livro é sobre a bissexualidade do Renato. O livro conta de uma maneira tão natural, que mesmo as pessoas mais conservadoras não se chocariam (apesar de eu achar que zero conservadores ouvem Renato). O momento em que ele conta para a mãe dele também é muito natural, e apesar de ela ficar abalada, ela não demonstra nada na frente dele, o que faz tudo ser mais leve.

A Legião Urbana não foi a primeira banda de Renato, e no livro acompanhamos toda a trajetória artística dele, que começa já na escola, fazendo teatro, e se estende, literalmente, até o fim de sua vida. Como Renato estava inserido num cenário musical em que a todo momento surgia uma nova banda de rock no Brasil, principalmente em Brasília, onde ele morava, o livro também acaba falando sobre as outras bandas, sobre cantores de MPB também, já que existia uma guerra entre os dois ritmos. Gostaria de abrir o espaço para dizer que não consigo entender MPB como um ritmo, como a maioria das pessoas faz, por que Música Popular Brasileira, na minha cabeça, é qualquer coisa que faça sucesso e seja feito por brasileiros.

Enfim, o livro é cheio de referências e citações de artistas, principalmente músicos, o que faz com que você saia dessa leitura cheia de coisas para ouvir, filmes para ver e livros para ler. Então se as décadas de 70, 80 e 90 te interessam muito, recomendo que leia esse livro para conseguir pegar várias dicas de cultura a ser consumida, por que existem inúmeras citações no livro.

Algo que eu não havia reparado na primeira leitura, mas que agora me incomodou muito foi a visão fechada do Renato. E sim, ele parece super aberto, a pessoa que aceita todas as pessoas como elas são e que ouve a todos, mas não era bem assim. Por ser homem, branco e de classe média, primeiramente, várias das coisas que ele reclamava, pra mim, que sou mulher negra e pobre, eram coisas tão ridículas que eu não conseguia entender o motivo da reclamação. Ele já dava ataque de estrelinha antes mesmo de ser uma, e isso me irritava. Era como se todos tivessem que seguir o que ele dizia, pois ele era sempre o mais sábio e devia ser seguido sem questionamentos.





























Uma situação específica me irritou profundamente, que é quando ele faz comentários idiotas, e claramente racistas, sobre religiões de matriz africana. E ele pode ser um gênio escrevendo músicas e aos olhos do público, mas ele era problemático pra caramba, e isso é algo que as pessoas que conviviam com ele diziam, e se você ler o livro com os olhares de quem quer conhecer, e não com os olhares de fã que acha que o ídolo é perfeito, você vai conseguir reparar isso. E claro, isso não o torna uma pessoa ruim, mas uma pessoa com vários erros, e definitivamente Renato não é uma pessoa que devemos ter como exemplo.

Digo isso por que, apesar de ter sido bem sucedido em todas as suas profissões, e de realmente se dedicar à elas, algo que podemos levar para as nossas vidas, Renato abusava da bebida, de drogas, muitas vezes era mesquinho e tinha muitos ataques de estrelismo. Todos podem se inspirar no artista, mas não na pessoa que foi Renato Russo.

Como artista Renato é um estouro! Uma das prova de sua maestria em escrever músicas incríveis é que até hoje, mais de duas décadas depois de sua morte, Renato ainda é conhecido e lembrado como um dos melhores e mais brilhantes artistas brasileiros. Suas composições são tocantes, sentimentais, e mesmo que não sejam tão "amorzinho" (pelo menos a maioria delas), fala sobre emoções. Acho muito interessante músicas que falam de sentimentos ruins como raiva e ódio de uma forma tão intensa quanto as dele.

E claro, por ter vivido num tempo em que o Brasil estava em colapso total, pessoas morriam por ser o que eram e por terem opiniões diferentes, as músicas dele são extremamente políticas e necessárias, não apenas para que nós nos lembremos do que aconteceu, mas para que nós possamos ficar alertas, fazer paralelos com o que estamos vivendo e nos atentar para as coisas que se repetem e que podem voltar a acontecer. Atualmente estamos vivendo um período obscuro na política brasileira, e apesar de me manter esperançosa, no sentido de acreditar que somos fortes o bastante para nos posicionarmos contra o que não é correto (qualquer tipo de preconceito, machismo, autoritarismo). Sinto um pouco de medo por ver certas coisas acontecendo, mas tenho fé de que no final tudo vai dar certo.

Na minha edição, essa vermelha que vocês viram nas fotos, há um bônus: uma parte dedicada ao filme de Faroeste Caboclo. É algo muito enriquecedor, pois além de falar sobre a construção do filme, fala sobre a construção dessa e de outras músicas de forma bem rápida. Aliás, durante o livro, a construção de várias músicas é destacada, o que enriquece muito a leitura.


Recomendo muitíssimo esse livro. Além de ser uma biografia incrível de um artista consagrado, contada de uma forma que parece romance, e que por isso deixa algumas partes mais leves, é um livro repleto de referências e citações de outros artistas que estavam compondo a cena brasileira nos anos 60, 70, 80 e 90. Recomendo também aos que gostam de livros com fotografias, pode parecer besta, mas sei que o trabalho gráfico do livro ajuda muito na hora de decidir se vamos comprá-lo ou não. Mesmo que você não ame Renato Russo, sugiro que compre para estudar um pouco mais sobre, principalmente, a ditadura militar, um período histórico extremamente importante na história do Brasil. Tem vídeo mostrando o livro lá no canal!




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