sábado, 14 de abril de 2018

Racismo nas universidades públicas


No dia dezesseis de março eu passei por uma situação de racismo. Um homem branco, de vinte e quatro anos, funcionário público, e que portanto deveria, no mínimo, não ser racista ou preconceituoso, me disse, em uma discussões sobre cotas raciais que "as cotas são injustas, por que se o negro quer entrar em uma universidade, ele tem que estudar como todo mundo, entrar por cotas fica fácil". Eu obviamente tentei falar sobre a importância das cotas, mas não consegui, pois ele me interrompeu dizendo "cala a boca e vai estudar". Vamos analisar um pouco a história. Ele diz para mim que os negros entram facilmente nas universidades pois não precisam estudar para isso, porque têm as cotas, e logo depois ele me manda estudar. Ele então está me dizendo que eu preciso estudar mais, por que eu sou negra. Entendem que ele me chamou de burra POR ser negra?

Fiz uma denúncia na secretaria da UEMG, universidade onde eu estudo. Por causa da denúncia, muitas pessoas vieram falar comigo, muitas dessas pessoas são negras, e me disseram coisas incríveis. Me agradeceram por ter feito a denúncia e mostrar que o fato de eu ser nova ali não significa que vou aceitar esse tipo de coisa, me agradeceram por que sabem que agora que uma denúncia por racismo foi feita, se acontecer novamente as pessoas terão coragem de fazer também. Me agradeceram por ter feito o caso se espalhar e o assunto ser discutido. Me agradeceram por ter sido forte quando o homem disse que iria me processar caso eu não retirasse a denúncia. Algumas pessoas me disseram que sou o orgulho delas, e sabe o que eu descobri? Povo negro forte, é povo negro unido!

Nos fortalecemos quando olhamos para a dor do outro, nos fortalecemos quando torcemos para que o outro ganhe a luta diária de todos nós. A minha pele não é tão escura, e mesmo assim eu passei por isso, e muitos negros bem pretos vieram falar comigo sobre situações que eles passaram e acharam melhor não denunciar, por medo do que viria depois.

A dica é: não tenha medo do opressor! Eles não podem calar nossa voz, não podem parar nossa luta, eles não vão conseguir isso se estivermos todos unidos, portanto, se vir alguém passando por alguma situação de racismo, ajude, sem violência, mas faça com que a pessoa veja que ela está errada, e se possível faça uma denúncia. Racismo é crime, e não importa em qual ambiente ele aconteça, todos podemos denunciar.

Houve uma reunião com o colegiado da faculdade para discutirmos o assunto, e infelizmente uma das professoras claramente não estava ali com o objetivo de resolver algo. Ela me disse que "racismo sempre existiu e vai continuar existindo, aceite" e fazia cara feia sempre que alguém me defendia. Concordo que racismo sempre existiu, o que mostra que não evoluímos tanto, e sei que infelizmente ele vai continuar existindo, mas eu não sou obrigada a aceitar isso! Não tenho que me calar ao ser ofendida por causa da cor da minha pele. Não tenho que ficar calada ao ver meus irmãos e irmãs pretas sendo mortos pela cor da pele. Não tenho que ficar apenas olhando meus irmãos e irmãs sendo chamados de macacos e pixaim. Eu vou lutar SIM! Eu não tenho que aceitar o racismo, tenho que lutar contra ele, lutar pela minha vida e pela vida dos outros pretos, por que aqui é nós por nós, se a gente não lutar, ninguém vai fazer isso pela gente.

Eu acho triste uma pessoa que diz isso estar no corpo docente de uma universidade pública onde ela vai ter todo tipo de aluno, de todas as etnias e raças, de todas as crenças e com ideias diferentes. E gostaria de deixar bem claro aqui que o problema com essa situação não foi ele ser contra as cotas, mas sim ter me dito que preto não precisa estudar para entrar e logo após me mandar estudar. Ele simplesmente desmereceu a minha presença ali por ser cotista preta. Mas sabe o que eu descobri depois? Ele entrou pelo vestibular como excedente, ele só entrou por que alguém desistiu de entrar. Quem é ele para desmerecer alguém? E sim, ele poderia ter sido o primeiro da lista, ainda sim ele não teria o direito de desmerecer a luta de alguém por uma vaga, muito menos pelo simples fato de essa pessoa ser negra.

Sei que minha denuncia movimentou muitas pessoas, sei que deixou os racistas nervosos e alertas, sei que muitas pessoas ficaram agradecidas, e é pelas pessoas agradecidas que vou continuar lutando. Esperem coisas incríveis sobre negritude aqui no blog e no canal, prometo que não vão se arrepender.

Não abaixem a cabeça, não procurem aprovação do opressor, denunciem quando se sentirem ameaçados e/ou ofendidos. No dia da reunião, eu fui com uma pintura africana que algumas tribos, principalmente na Nigéria usam. É uma pintura que as mulheres usam durante as guerras, significa que estão prontas para continuar lutando, para matar e morrer. Sim, muitas das mulheres não participam de fato das guerras, das lutas corpo a corpo, mas sabemos que as lutas da vida são bem mais do que lutas corpo a corpo. É uma luta não corpórea, mas que mata tanto quanto as que são. Lutemos!



2 comentários:

  1. Nossa, me entristece muito que a universidade que estou estudando teve essa postura diante a um assunto tão importante.
    Continue lutando assim porque racistas não passarão!

    Uma Mente Inquieta

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    1. Eu fiquei bem triste quando aconteceu, tanto o fato em si quanto a reunião, mas tudo que aconteceu depois, todas as coisas que vão acontecer por causa disso, me deixam mais aliviada e até feliz em saber que fiz minha parte e encorajei muita gente a não se calar!

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